segunda-feira, 13 de abril de 2009

Entrevista - Revista de História da Biblioteca Nacional

Entrevista realizada para a Revista de História da Biblioteca Nacional em 01/03/2009.

João Gurgel, fundador da Gurgel, faleceu no último mês de janeiro. O Clube prestou alguma homenagem, teve algum encontro dos membros onde esse fato foi lembrado? Como foi?
Nós gostaríamos de ter ído ao enterro, mas foi tudo muito corrido e rápido. Somente um de nós conseguiu ir.
Avaliamos que não seria legal fazer uma homenagem em função de seu falecimento, mas preparamos para março de 2009, um passeio off road* no primeiro final de semana após a data de aniversário do Gurgel.
Será um grande evento.
* O evento aconteceu em 29 de março de 2009 na região de São Lourenço da Serra/SP e contou com 20 veículos.

Quantos membros tem o Clube Gurgel Guerreiro?
Temos 976 pessoas cadastradas.

Por que tanta paixão pelos veículos da Gurgel?
Os motivos são diversos, cada proprietário tem uma explicação. São paixões que começam na infância ou até mesmo na fase adulta. Mecânica confiável e design completamente diferenciado de tudo também atraem muitas pessoas.

Qual modelo de Gurgel vc possui?
Um Tocantins X12 e um X15.

Qual sua opinião sobre a história de João Gurgel, as dificuldades que ele teve para criar carros populares e 100% nacionais? Ele foi importante para o Brasil?
Ele teve uma história incrível e fascinante. Uma pessoa muito obstinada pelos seus ideais. Muitas pessoas acham que o processo de falência denota incompetência, mas pouco sabem que a falência foi inegavelmente encomendada com a abertura de mercado da forma como foi, redução de IPI para as empresas multinacionais e a recusa de empréstimo do BNDS, que anos depois deu grana para a Volks produzir o Fusca.
Além disso, não conheço nenhuma outra empresa que possa ter falido em momento de expansão e abertura de uma nova fábrica.
Ninguém fala, nem lembra, mas tem uma fábrica da Gurgel com maquinário importado da Renault e Peugeot em Fortaleza/CE. As máquinas sequer foram tiradas da caixa. Todas as máquinas da linha de produção foram importadas.
Gurgel foi para fortaleza porque dizia que o Nordeste precisava se desenvolver, que uma fábrica de automóveis tem muitos produtos agregados gera emprego em diversas outras indústrias e ramos. Tecidos, borrachas, vidros, peças em geral etc.
Mas mesmo montando a fábrica lá, não teve nenhum incentivo. Nenhum. Anos depois a Ford foi beneficiada com insenção de impostos pelo governo da Bahia.
Isso acontecer não vale questionar, mas deixar de ajudar a Gurgel é uma vergonha na história do desenvolvimento brasileiro.


João Gurgel foi bastante criticado pelas suas inovações. Ele conseguiu produzir carros eficientes, apesar de populares?
Quanto a isso não há questionamento. Quem produziu veículos por quase 25 anos e exportou para 42 países não pode ser questionado quanto a sua eficiência.
Já havia um grande público fiel a Gurgel, pessoas que já estavam no oitavo, quinto carro zero, todos Gurgel.
Porém, a Gurgel só produziu um carro que podemos chamar de popular, o BR800. Todos os demais veículos eram extremamente caros na época. Um X12, por exemplo, era bem mais caro que um Passat, um Voyage etc. O Carajás, Supermini e XEF eram considerados carros extremamente luxuosos.
Esses questinamentos talvez aconteçam porque o BR800 era um veículo pequeno de apenas 800 cilindradas, e mesmo com os congestionamentos nas grandes cidades e todos os problemas que isso acarreta, a nossa sociedade ainda aprecia veículos grandes e potentes, mesmo que seja para pegar congestionamento no momento de ir trabalhar.
É uma questão cultural. Os Estados Unidos também são famosos por gostarem de carros assim. Já na Europa e na Ásia, veículos pequenos, feitos principalmente para o urbano, são bem aceitos e admirados.
Espero poder ter ajudado. Qualquer coisa só falar.
Abraços, sucesso e boa sorte!

Fábio Evangelista

Link da matéria publicada: http://revistadehistoria.com.br/v2/home/?go=detalhe&id=2323